VIEIRA É MAIOR AMEAÇA A TARSO

Estrategista Paulo Di Vicenzi faz primeiro estudo qualitativo após definição de candidaturas ao governo gaúcho. Os maiores adversários dos candidatos são eles próprios.

 

Vieira da Cunha (PDT) pode se converter no principal depositário de votos dos eleitores descontentes ou frustrados com a gestão do governador Tarso Genro (PT). Ivo Sartóri (PMDB) tem mais possibilidades de tirar votos da candidata Ana Amélia Lemos (PP). As constatações são resultado de pesquisa qualitativa conduzida pelo consultor e estrategista eleitoral Paulo Di Vicenzi, diretor estadual da ABCOP - Associação Brasileira de Consultores Políticos.

 

"Neste momento, dois sentimentos dominam a percepção dos eleitores: Ana Amélia pode ser eleita já no primeiro turno e, caso isso não ocorra, o adversário pode não ser Tarso Genro, que busca sua reeleição. A disputa pela presença em um possível segundo turno coloca Vieira da Cunha e Ivo Sartóri dentro do jogo, caso ninguém faça mais que 50% dos votos válidos. Os maiores adversários de cada candidato serão eles próprios", comenta o estrategista Paulo Di Vicenzi. Ele explica que o período de propaganda eleitoral representa ao mesmo tempo muitas oportunidades e também vários riscos. "O maior desafio para qualquer candidato é posicionar corretamente a sua candidatura, isso exige sensibilidade apurada e informações confiáveis para uma acertada leitura do ambiente e das condições do confronto.” Com mais de 20 anos de consultoria eleitoral, Paulo Di Vicenzi diz que "é muito fácil um candidato errar a mão tanto em coisas que parecem simples, como a escolha de um slogan, a foto do santinho ou a música da campanha, como também naquilo reconhecidamente mais complexo, como na formação de alianças, na seleção de argumentos e no próprio tom do discurso a ser adotado em diferentes ambientes ou para públicos distintos."

 

Paulo Di Vicenzi fez este estudo usando a técnica de entrevista em profundidade. “Eu crio condições para conversas casuais com eleitores, nos lugares onde eles estão. São diálogos naturais, não uso questionários ou qualquer recurso que coloque a pessoa na defensiva. Por não se sentirem interrogadas e nem ameaçadas, as pessoas abrem seus corações e dizem o que pensam de verdade sobre os mais variados assuntos.” Segundo o estrategista eleitoral, esse tipo de investigação permite uma compreensão mais profunda sobre aquilo que influencia verdadeiramente a decisão de voto dos eleitores. "As pesquisas quantitativas, aquelas que mostram resultados numéricos e percentuais de intenção de voto nos candidatos, praticamente não servem para uma análise estratégica, porque elas só mostram o quanto, não conseguem de informar os motivos das opiniões ou das escolhas. E é isso que vale ouro nesse momento, para orientar o posicionamento mais adequado a determinada candidatura, de forma a torná-la competitiva", explica Paulo Di Vicenzi. Ele esclarece que esse tipo de estudo, por não constituir um levantamento estatístico de intenção de voto, não está sujeito às determinações da legislação eleitoral. “Com essa técnica, não preciso entrevistar centenas ou milhares de eleitores. Posso descobrir o comportamento deles e os sentimentos mais fortes de comunidades inteiras conversando com algumas poucas pessoas, normalmente menos de 20. O importante é saber escolher com quem conversar e como estimular o diálogo”, esclarece.

 

CONSTATAÇÕES

 

Apesar de identificar que Vieira da Cunha pode capitalizar uma quantidade significativa dos votos de eleitores descontentes com o governo de Tarso Genro, isso, por si só, não garante ao candidato a presença no segundo turno, disputa que pode até nem ocorrer, alerta Paulo Di Vicenzi. Antes disso, tanto Vieira da Cunha como Ivo Sartóri precisam vencer um outro desafio, que é o alto nível de desconhecimento de seus nomes junto ao eleitor comum. "Familiaridade é um fator poderosíssimo, que pode desequilibrar qualquer competição eleitoral. Ninguém conquista popularidade consistente da noite para o dia e ela normalmente é obtida fora do ambiente político. As pessoas tendem a votar em quem elas imaginam que conhecem mais, que percebem como mais próximas e até amigas, mesmo que nunca tenham estado juntas fisicamente", detalha Paulo Di Vicenzi. O estudo mostra que "o atual favoritismo de Ana Amélia (PP) para o governo e de Lasier Martins (PDT) para o senado é decorrente dos altos níveis de familiaridade associados aos dois candidatos. A maioria dos eleitores dos dois candidatos não tem ligação ou sequer simpatia partidária. Não são votos ideológicos, são votos de audiências cativas conquistadas ao longo do tempo, pela exposição na mídia em programas de grande penetração popular”, informa. Os resultados indicam que a imagem de Ana Amélia ainda está mais fortemente referenciada no tempo em que atuava em televisão e rádio do que neste seu primeiro mandato de senadora.

 

Vieira da Cunha é mais conhecido pela militância e filiados do PDT. Para Paulo Di Vicenzi “isso não é pouco diante do fato de que é o partido com maior número de filiados no Estado, passando de 300 mil”. Porém, ainda está muito longe de garantir a presença do candidato em um eventual segundo turno. Precisa ser reconhecido por contingentes muito além dos círculos partidários e o pequeno tempo que terá na propaganda de rádio e tv pode ser mais um complicador. Ele terá que ser muito preciso nos argumentos e aproveitar os espaços com muita inteligência e objetividade, pensando em objetivos claros a serem alcançados. “É comum ouvir das pessoas que o PDT é um partido de velhos. Ficar ancorado no histórico do trabalhismo e nas lembranças dos líderes do passado pode reforçar essa ideia, quando o que os eleitores desejam é ouvir alguém que pense e fale sobre o futuro, que mostre alternativas de gestão para dias melhores e seja percebido como capaz de inovar”, analisa Paulo Di Vicenzi.

 

Quando é citado o nome de Ivo Sartori (PMDB), é comum os eleitores perguntarem “quem é esse?”. Seu nome é mais conhecido por pessoas de municípios da Serra gaúcha, especialmente Caxias do Sul, onde ele foi vereador e prefeito por duas vezes. Tem como vantagem o fato de pertencer a um partido reconhecidamente bem estruturado no Rio Grande do Sul, com cerca de 250 mil filiados, mais de 200 políticos ocupando os cargos de prefeito ou vice-prefeito e quase 1.200 vereadores. Tem ainda oito deputados estaduais, quatro federais e um senador. Por outro lado, chega nessa eleição dividido, uma parte alinhada com o candidato a presidente Eduardo Campos (PSB) e outra dando apoio à reeleição da presidente Dilma (PT). “Os eleitores ainda têm dificuldades para falar sobre essa questão, preferem mudar de assunto por absoluto desconhecimento”, constata Paulo Di Vicenzi. É algo a ser melhor trabalhado durante a campanha. De qualquer forma, a primeira missão da campanha de Ivo Sartori será torná-lo mais conhecido para além dos limites da Serra gaúcha e ser percebido como autoridade de liderança compatível com o tamanho do seu partido.

 

No caso do governador Tarso Genro, tem gente que pergunta “onde foi parar o Rio Grande do Sul, do Brasil e do Mundo?”, lembrando o slogan da campanha anterior do PT e que sugeria um período de grande crescimento e evolução para o Estado. Hoje, isso exemplifica a frustração sentida por muitos eleitores, que acreditaram nas promessas e não conseguem vê-las cumpridas. “Ao questionar sobre as principais obras e realizações do atual governo, alguns falaram, de forma irônica, em ‘salário dos professores’ ou ‘segurança’. Quase sempre passavam a comentar sobre os problemas. A sensação é que, no mínimo, houve falha na comunicação, porque as pessoas não sabem dizer o que o governo Tarso fez. Dificilmente isso poderá ser recuperado na propaganda eleitoral”, avalia Paulo Di Vicenzi. Os eleitores que dizem ter votado em Tarso na eleição anterior foram provocados para dizer se repetiriam o voto em outubro. A confirmação existe, normalmente, junto a eleitores fortemente identificados com o PT.  Quem não é filiado ou simpatizante manifesta certa indecisão, dizendo “posso votar em outro candidato, menos na Ana Amélia e no PMDB.” Isso sinaliza que o voto em Tarso é claramente partidário, enquanto que a rejeição aos demais não. Por exclusão, mesmo que não tenha seu nome mencionado de forma espontânea, quem pode ganhar com isso é Vieira da Cunha. “Essa é uma possibilidade, não uma garantia de que vá de fato ocorrer, vai depender de como ele se apresentar aos eleitores a partir de agora”, destaca o estrategista eleitoral Paulo Di Vicenzi.

 

Com relação à Ana Amélia, seus eleitores majoritariamente não possuem alinhamento partidário ou ideológico. Ela é favorita pela imagem residual criada durante os anos em que aparecia em programas de tv e rádio, comentando principalmente notícias relacionadas ao agronegócio e economia. “Os eleitores consideram que Ana Amélia Lemos faz um bom trabalho como senadora, mas ninguém consegue citar com segurança alguma realização dela no cargo. Isso sugere que a imagem anterior dela ainda é mais forte e pode ser reavivada com a propaganda eleitoral”, interpreta o consultor. Por ser favorita, a candidata deve virar o alvo preferencial de ataque dos adversários, que podem tentar desconstruir seu discurso. “Ataques e agressões raramente funcionam em uma campanha eleitoral, isso pode até animar a militância de quem adota essa tática, porém os eleitores costumam rejeitar essas ações e dão ainda mais apoio a quem é vítima disso. Agora, a estabilidade e segurança da Ana Amélia vai depender só dela.” Paulo Di Vicenzi considera que “se ela fizer mais críticas do que oferecer soluções, pode ter problemas.”

 

Quando aos demais candidatos, ninguém sabe quem são e, por isso mesmo, não conseguem opinar nesse momento. De maneira geral, os eleitores se mostram bem pouco interessados nas eleições deste ano, mesmo entre aqueles que afirmam não estar envolvidos com os jogos da Copa do Mundo. De maneira generalizado, comentam sobre as dificuldades econômicas, os esforços para pagar prestações assumidas no ano passado e temor de perder seus empregos. “Essa preocupação econômica está em um nível mais alto do que a verificada na eleição de 2010, a euforia deu lugar à cautela e isso cria um cenário totalmente diferente para disputa eleitoral. Isso vai se refletir diretamente na intenção de voto para presidente da república, onde a competição já está se mostrando mais acirrada e nada indica que isso possa diminuir até outubro”, finaliza Paulo Di Vicenzi.

 

Paulo Di Vicenzi é consultor político e estrategista eleitoral, diretor da ABCOP – Associação Brasileira de Consultores Políticos, da empresa de pesquisas Qualidata Informações Estratégicas e da consultoria Di Vicenzi Voto e Poder. É autor do capítulo “Do Anonimato à Vitória em Apenas 43 Dias”, publicado no livro Marketing Eleitoral – Aprendendo com campanhas vitoriosas (Abcop,2008). Ajudou a eleger sete candidatos em cinco eleições majoritárias sucessivas.