UM CAVALEIRO E UM VILÃO DELIRANTES 

Don Quixote, o da Triste Figura, pendia para o bem. Via o que somente seus enlouquecidos olhos viam. Dulcinéia, a bem amada, a bordar com fios de ouro no balcão de seu palacete, segundo o relato de Sancho descascava cebolas na exígua cozinha do casebre paterno. Perversos gigantes malfeitores nas rodas dos moinhos. Pobre, guarnecido por restos de uma velha armadura, montando esquálido cavalo, lançou-se o fidalgo pelos caminhos da Mancha na dura missão de desfazer agravos e proteger viúvas e oprimidos.

Luís Inácio, afortunado retirante, também se move num mundo particular, só seu. Diferentemente do lidador manchego não é chegado a sacrifícios. Comum lhes é o gosto pela grandiloquência. Quixote promete feitos que obscureceriam a glória de Amadis de Gaula, lendário herói da cavalaria andante. Lula já se comparou a Juscelino, a Vargas, e, em momentos de surto mais severo ao próprio Jesus. Quixote curva-se com altiva reverência ante reis, duques, damas da mais alta nobreza, na real proprietários de toscas pousadas onde chega com seu lúcido e sofrido escudeiro. Lula fala de um Brasil por ele construído em que a almejada igualdade foi por fim lograda, reescreve a história pátria decretando dia hum da nacionalidade aquele em que vestiu a faixa presidencial pela primeira vez.

Ontem, quarta feira, em entrevista concedida a Roberto D’Ávila, Lula transpôs o intransponível. O competente entrevistador, com expressão e tom de voz serenos, perguntou ao milionário palestrante como via os escândalos, mensalão e petrolão, ocorridos nos governos petistas. Vi com estupefação, respondeu impávido o demagogo, alias eu e o mundo. Para eximir-se de culpa fez o extremo sacrifício de poupar Fernando Henrique em quem tem mórbida fixação, vista a notoriedade do sociólogo a quem escolheu como rival. Os criminosos do petrolão, afirmou Lula, estão na empresa há mais de trinta anos. Em sua alucinada desfaçatez pretende o ex-presidente fazer-nos crer que o amazônico escândalo circunscreve-se aos paus mandados que seu governo e o de sua sucessora, por ele controlado, puseram em postos chaves para o desempenho do assalto à estatal. Por esta afirmação vê-se que Lula não é apenas o amoral que não se furta de enriquecer de forma meteórica, que vê com euforia enriquecerem seus filhos, sobrinhos, apaniguados, é também um mentecapto para o qual nós outros, seus compatriotas, somos um rebanho de néscios a quem se pode passar a mais maltrapilha das mentiras.

O inocente Quixote fantasiava aventuras. O aventureiro Lula fantasia a indecência.